terça-feira, 26 de maio de 2009

Especial - Capa

A verdade nos degraus do podium

A necessidade de vencer, de compensar anos de treinamento pesado e de enfrentar a competição, torna o assunto dopping um fantasma na vida dos atletas. Mas, muitas vezes, os resultados do antidopping surpreendem treinadores e atletas, que se sentem injustiçados.
O uso de anabolizantes e substâncias para aumentar o desempenho em atividades físicas, princi-palmente em atletas, é um assunto que volta e meia aparece nos jornais. Em Ribeirão Preto existe o caso da nadadora Renata Burgos, um dos destaques do Troféu Open em 2006 por vencer 50 metros livres e por conquistar o índice para o Mundial de Melbourne. Às vésperas do Pan Americano de 2007, ela sofreu suspensão de dois anos por ser encontrado no exame de antidoping a substância Stanozolol em seu suplemento. Mesmo com o exame positivo, ela negou saber da existência desta substância nos suplementos que ingeria. "Teoricamente, o Stanozolol apareceu no exame, mas no rótulo do produto não constava essa substância. Já aconteceu de alguns suplementos serem tirados de circulação por estarem contaminados, só que no meu caso não foi levado em consideração isso. O exame foi feito em Vitória, na competição em que fiz o índice do mundial. Recebi a notícia um tempo depois porque mandaram as amostras para o Canadá, e a resposta demorou mais ou menos um mês. Atrasou meus planos, mas em 2012, com certeza vou estar pronta para competir", afirma Renata.


Renata Burgos
Falar do ser humano, do atleta, da necessidade de obter a glória, até onde vai a vaidade humana e até que ponto as competições olímpicas são concorridas lealmente é que torna o assunto complexo. Lista de prejuízos Há alguns anos, o presidente da Academia Nacional de Medicina Esportiva dos Estados Unidos, Bob Goldman, realizou uma pesquisa questionando atletas sobre a possibilidade de tomarem uma certa substância proibida para aumentar seu rendimento físico e sem possibilidades de ela ser detectada no exame de antidopping. A resposta afirmativa foi maciça: de 198, apenas três disseram que não tomariam. Mas o que assusta é saber que mais da metade admitiu que se doparia mesmo sabendo que essa substância poderia levar à morte. Já Renan Rossin, 23 anos, não acha certo o uso de dopping. "Em minha opinião deveria haver competições justas, sem atletas que fazem uso de dopping. Sei que muita gente usa, tanto no nível brasileiro quanto no mundial. Dizem que quem não faz uso nunca subirá ao podium, mas não acho certo", afirma. Segundo o biomédico Sidnei Di Túlio, as substâncias mais comumente usadas no esporte são divididas em cinco classes: estimulantes, analgésicos narcóticos, agentes anabolizantes, diuréticos e os hormônios peptídicos. "As anfetaminas, cocaína, efedrina e a cafeína do grupo dos estimulantes são substâncias usadas para conseguir os mesmos efeitos da adrenalina tal como o aumento da excitação. Já a morfina, do grupo dos analgésicos, proporciona a diminuição da dor causada pelo esforço físico. Os agentes anabolizantes provocam aumento dos músculos. Os diuréticos são usados por atletas esportivos com a intenção de mascarar o dopping e os hormônios peptídicos aceleram o crescimento do corpo além de diminuir a sensação de dor", explica. Ele ressalta o perigo do uso destas substâncias. "A lista dos prejuízos é imensa e incompleta, pois, como não há controle, os atletas usam doses cavalares dessas drogas e podem surgir efeitos colaterais desconhecidos", alerta. Existem também efeitos secundários que são potencialmente prejudiciais ao organismo, segundo Sidinei. "Falta de apetite, arritmias cardíacas e palpitações, hipertensão arterial, alucinações e diminuição da sensação de fadiga, além de perda de equilíbrio e coordenação, náuseas, vômitos, insônia, depressão e diminuição da capacidade de concentração", enumera. O controle do dopping pode ser realizado pelo exame de sangue ou da urina, imediatamente após o término de uma competição para os atletas.
Pode-se dizer que o esporte profissional, hoje, transformou-se em um bom negócio. Segundo João Pessoa Guimarães, ex-nadador profissional, para ter patrocinadores ou receber uma bolsa, o atleta precisa ter um excelente desempenho e, muitas vezes, existem acordos entre atleta, família e entidade, que é um clube ou uma universidade que incentivam o uso dessas substâncias proibidas para chegar ao podium. Vitamina C e complemento alimentar João Guimarães, foi campeão paulista, campeão brasileiro e sul-americano, convocado para as Olimpíadas de Moscou, na década de 80. Ele conta que já conviveu com atletas que buscavam auxílio químico para aumentar a força ou suportar o treinamento. "Essa situação faz parte do atleta de alto nível. O detalhe faz muita diferença, como passar do quinto para o primeiro lugar num campeonato brasileiro. Na minha época, o dopping era coisa de criança, a gente tomava Cebion, ou Efinal, que eram apenas cápsulas de vitamina C e E, para aumentar a força, ou então Sustagen, para complementar a alimentação, nada que fosse injetável ou que mexesse com os hormônios, fígado ou pâncreas. Mas já existia a intenção de usar produtos químicos para levar vantagem em uma competição", recorda.
João Guimarães ex-nadador profissional
João Guimarães lembra de fatos históricos que contribuíram para estudos voltados ao desempenho de atletas. "Desde o começo, países como os EUA, antiga União Soviética e Alemanha Ocidental, direcionavam todas as pesquisas para as armas biológicas com a intenção de disseminar epidemias. Com o advento da televisão, as Olimpíadas passaram a ganhar grandes proporções e foi então que esses cientistas resolveram cuidar da fisiologia, do esforço, porque passou a ser sinônimo de superioridade de raça ao país que levasse o ouro", afirma. Ele diz que, daí para frente, a partir de 1945, começaram a ser desenvolvidas tecnologias para levar o atleta ao podium e que, principalmente nos paises comunistas, onde ninguém podia questionar nada, como Cuba, antiga Alemanha Oriental, União Soviética, os cientistas eram cobrados e obrigados a trabalhar nesses projetos. O tempo passou, as pesquisas avançaram e hoje existem drogas cada vez mais difíceis de serem detectadas no organismo. " O COI - Comitê Olímpico Internacional - e a Agência Mundial Anti Doping (Wada) não conseguem mais acompanhar a evolução dos laboratórios e dos cientistas dos países desenvolvidos. Nos Jogos Olímpicos de Verão de Pequim de 2008, devem surgir resultados e encontradas substâncias nos exames de antidoping que hoje ainda não são proibidas. O COI e a Wada vão testar, comprovar e proibir somente na próxima Olimpíada, pois não se pode proibir aquilo que não se conhece", explica. Guimarães diz que o processo para afastar um atleta com exame de antidopping positivo é demorado e implica em diversos processos até o afastamento, além de proporcionar aos cientistas chances de desenvolver cada vez mais drogas difíceis de serem denunciadas pelos exames. "Tendo o resultado em mãos, vem a contraprova, depois o julgamento, aí tem uma série de procedimentos que demoram vários meses. É difícil você suspender o atleta em uma competição próxima. Ele vai responder pelo uso indevido desse hormônio depois que já levou a medalha para casa. Vão caçar essa medalha e os direitos, resgatar os resultados, é muito complicado", revela. Ele exemplifica o caso das nadadoras chinesas para mostrar como ocorre a evolução do dopping entre os pesquisadores. "Desde que foi determinado que a China fosse a sede das Olimpíadas, a fiscalização começou a dar visitas incertas durante os treinos da equipe de natação. Em uma dessas visitas, pegaram seis meninas e as tiraram da competição. Isso proporciona aos cientistas e os treinadores, o desenvolvimento de formas melhores para que os competidores chineses não sejam pegos nos exames de antidopping". Em meio a tanta disputa desleal, o ex-nadador lembra que ainda existem atletas que conseguiram a vitória sem usar artifícios químicos. "Tivemos muitos atletas com resultados limpos como Fernando Scherer, Gustavo Borges, entre outros, que com muito treino, motivação e dedicação conseguiram chegar lá. Mas hoje é difícil chegar ao podium sem usar qualquer tipo de doping. Esse artifício vai fazer parte da vida dos atletas de alto nível, para sempre", lamenta.

"Era para sair o exame da contraprova primeiro e depois, a análise do suplemento, pois foi levantada a hipótese de que a substância estaria no suplemento, já que era importado e poderia ter a substância Stanozolol. Esses produtos, muitas vezes, vêm contaminados com certas substâncias. Só que eles fizeram a análise do suplemento antes, e depois a análise da contraprova. Na análise do suplemento, foi encontrado o Stanozolol. Fiquei dois anos afastada, não pude participar do Pan, nem das Olimpíadas de Pequim, e o último dia de afastamento será dia 14 de dezembro deste ano. Mas não gosto de falar muito sobre este assunto porque já passei por muitos problemas, não pude participar dos jogos que eu queria ir para fazer uma prova individual. Isso apenas atrasou meus planos. Tenho que pensar em melhorar lá pra frente, agora só quero esquecer o que foi, quem fez, o que fez, com quem fez, se teve algum culpado, quem foi. Quero só pensar em treinar pra começar no ano que vem já competindo bem. Vou começar com o torneio regional, e quero muito nadar o Mundial de natação em piscina curta, em Moscou. Só não sei se vai dar tempo de ser feito o índice. Hoje existe tanta tecnologia que não acredito que seja necessário fazer uso de dopping para chegar ao podium. Em muitos esportes, a gente vê acontecendo esse problema. Agora que existe um combate maior para o uso de dopping, e o pessoal está mais em cima, acaba aparecendo bastante coisa. O uso de dopping não é o caminho para ninguém, até porque o esporte é visto como uma coisa saudável. Não acho que as pessoas devem sair julgando e achar que todo mundo faz uso, não é bem por aí. Claro que precisa ter esse combate, mas tem muitas formas de se chegar a um bom resultado.". Renata Burgos, nadadora O treinador Christos Iakovou da seleção grega de halterofilismo renunciou ao cargo em abril deste ano, após ser indiciado pela Justiça por fornecer anabolizantes aos atletas de sua equipe. O esporte, que já levou medalhas das Olimpíadas à Grécia, pode ficar fora das competições de Pequim. Foram flagrados dez dos onze atletas da equipe do treinador nos exames de anti doping, e estão respondendo processos. (Fonte: Estadão) Tatyana Lysenko, russa, 23 anos, recordista na modalidade lançamento de martelo feminino, foi flagrada pelo uso de um bloqueador de hormônios proibido pelas regras da Agência Mundial Anti Doping (Wada) em um exame realizado fora de competição poucos dias depois de bater o recorde mundial da modalidade, há um ano. A Federação Internacional de Atletismo (Iaaf) anunciou em maio a suspensão da atleta por dois anos. Ekaterina Khoroshich, também pegou dois anos pelo uso do mesmo tipo de substância. (Fonte: Estadão)

"Comecei a nadar em Piracicaba. Com 15 anos, fui para São Paulo treinar pelo Vasco da Gama. Fiquei dois anos, vim para Ribeirão Preto e comecei a melhorar meus resultados. Fui campeão brasileiro seis vezes, consegui ir para Copa do Mundo e fiquei em 4º lugar. Fui vice-campeão brasileiro absoluto no 100 Medley, além de recorde paulista e alguns recordes brasileiros. Treino todos os dias de segunda a sábado, e quando estamos em fase intensa de treinamento chego a treinar de cinco ou seis horas por dia. Minha vida é muito regrada. Não posso sair muito, durmo cedo, me alimento bem. Não acho certo o uso de dopping. Em minha opinião, deveriam existir competições justas. Sei que muita gente usa, tanto no nível brasileiro quanto no mundial. Dizem que quem não faz uso de dopping nunca subirá ao podium, mas não acho certo. Os atletas deveriam dar tudo de si nos treinamentos sem precisar recorrer a esses artifícios. Hoje é muito difícil você ver um atleta de alto nível não fazer uso de dopping". Renan Rossin, nadador.
Renan Rossin - nadador

"Não sei se é impossível chegar ao podium sem fazer uso do dopping, mas tudo nos leva a crer que a realidade de um podium olímpico é bem distante da nossa realidade. As tecnologias de diversas áreas são muito avançadas para aquilo que a sociedade tem disponível, até mesmo o dopping. O dopping que se tem disponível no mercado é um dopping barato, de 1970. Hoje em dia, acredito que as coisas estejam bastante avançadas. Na verdade, o dopping está sempre na frente do antidoping. Isso sempre existiu e sempre vai existir. Em minha opinião, o exame que se faz, é uma forma de tentar coibir o uso desenfreado e desordenado disso. Acredito que existem atletas que conseguem chegar ao podium sem fazer uso do dopping, mas é quase impossível. Tudo é dopping, na verdade. O sono, a comida, um suplemento, tudo que você faz para se recuperar é anabolizante. O que acelera o processo são os esteróides anabolizantes. Esses são ilegais e podem causar problemas de saúde, irreparáveis até". Marcelo Monterosso Teixeira - Treinador de Natação da UNAERP/SME


Marcelo Monterosso Teixeira

"Já faz 11 anos que treino na equipe de natação. Venho evoluindo muito, já participei de campeonatos fora do Brasil. Já participei do Sul- Americano no Chile, na Copa Latina na Argentina. Fui campeã brasileira na categoria desde infantil até Junior II e de tantas outras competições. Nunca passei por um exame de dopping, mas já vi como é feito. Quando o atleta é chamado, ele não pode recusar a realizar o exame, pois fica subentendido que ele faz uso. O atleta é acompanhado até o banheiro. Lá, ele fica nu do peito para baixo e dividem-se duas amostras de urina coletadas no pelo próprio atleta, que é responsável por essa coleta. Coloca-se a urina em potinhos lacrados dentro de uma bolsinha, que também é lacrada. Depois, o atleta assina um papel, e esta bolsinha é levada para ser feito o exame. Tem de ser feito o exame mesmo, porque é desleal competir com pessoas que usam certas substâncias para ajudar no desempenho. Isso é trapacear no esporte. É preciso ser justo e correto" Taiane Carnot Moda, nadadora, 21 anos

Taiane Carnot Moda

Os agentes utilizados normalmente são os estimulantes: analgésicos narcóticos, os anabolizantes, os diuréticos e os hormônios peptídicos. Sendo os mais comumente utilizados e conhecidos, os agentes anabolizantes, que são compostos derivados de um hormônio masculino, a testosterona. Quando administrados no organismo agem aumentando o tamanho dos músculos. Os efeitos são diversos, dependendo do agente e da função; ou seja, do que o atleta está pretendendo melhorar. Por exemplo, aumentar a excitação utilizando estimulantes que agem como a adrenalina, diminuir a dor através de morfina ou substâncias análogas. Os diuréticos que aumentam a formação e a excreção da urina, com intuito de provocar perda de peso principalmente em competições que são classificadas pelo mesmo, como boxe, judô, etc. Outras substâncias muito utilizadas são os hormônios peptídicos e análogos que atuam no organismo de modo a acelerar o crescimento corporal e diminuir a sensação de dor. A gonadotrofina coriônica humana, o hormônio do crescimento, o hormônio adrenocorticotrófico e a eritropoetina são alguns exemplos. O controle do dopping pode ser realizado pelo exame do sangue ou da urina, imediatamente após o término de uma competição para os atletas, podendo também ser feito a qualquer momento da vida, durante um treinamento, em sua residência e até mesmo algum tempo antes ou depois de uma prova. A realização deve ser feita por laboratório credenciado pelo órgão competente".

domingo, 24 de maio de 2009

Mercado & Tendências

O abalo da economia mundial e o negócio do livro

A crise que os Estados Unidos atravessa começou com inúmeras dívidas não pagas no mercado imobiliário e desenrolou em uma crise no mercado de ações, no câmbio e conseqüentemente no crédito. A crise espalhou-se pelo mundo e no Brasil. A restrição de crédito passou a ser a maior preocupação dos economistas e empresários.
Márcia Cristina Bastos Garcia, gerente financeira da Editora Vozes diz que a restrição de crédito tem mostrado impacto nos negócios.

O mercado editorial sofre com a crise, segundo Márcia Cristina Bastos Garcia, gerente financeira da editora Vozes, Petrópolis, Rio de Janeiro. “A restrição de crédito tem realmente mostrado impacto nos negócios. Observamos nosso custo financeiro subir na casa de 20% além de verificarmos o enxugamento das linhas de crédito. Se até recentemente tínhamos livre trânsito no mercado bancário, tendo opção de escolher com qual instituição financeira, hoje já sentimos a falta de crédito. Dois dos maiores bancos do país já nos informaram que não estão liberando crédito e não possuem linha para nos ofertar. Os demais vivem um dia de cada vez, evitam negociar taxa de juros e não se comprometem em concessões de crédito por prazo superior a 6 meses. Em julho negociamos a importação de um equipamento de R$ 2.5 milhões que está previsto para embarcar no próximo mês para o Brasil. Certamente a crise também impactará nesta operação, seja pela elevação do euro, seja pela elevação da libor (taxa de juros europeu), seja pela redução do prazo de financiamento. Vemos também que a restrição de crédito pode ir além. Também temos clientes pessoas jurídicas, de porte pequeno e médio, que normalmente utilizam - ou utilizavam - linhas de desconto de títulos e capital de giro para movimentar o dia-a-dia de suas empresas, com o aumento das taxas e a escassez na oferta dessas linhas, tememos que estes clientes reduzam seu volume de compras, ou ainda, se tornem inadimplentes”.
Reinaldo Cafeo, economista, conselheiro do Conselho Regional de Economia, analisa o momento em que o Brasil atravessa. “Na prática já observamos uma crise de confiança. O governo brasileiro e sua equipe econômica não transmitiram aos agentes econômicos a real dimensão da crise internacional, taxando simplesmente como uma "marolinha" o que na prática não se confirmou. Duas importantes variáveis conduziam o consumo das famílias: renda e consumo. Categorias importantes conseguiram ao longo de 2008, reposição salarial acima da inflação. Na outra ponta, o mercado estava líquido, com financiamentos a perder de vista. O mercado, portanto, tirava proveito do aquecimento de demanda. Com a crise e o pessimismo dos agentes econômicos, ocorreu uma reversão do cenário. Algumas pessoas mesmo ainda não sendo afetadas diretamente pela crise, passaram a ter um comportamento mais cauteloso, adiando o consumo de bens que não lhe demonstram ser essenciais. Outras pessoas já sentiram isso diretamente, notadamente em setores que dependem do crédito e do comércio exterior”, diz.
Em relação ao mercado editorial, Cafeo acredita que a precaução que o brasileiro está tendo em relação aos gastos, poderá contribuir com queda nas vendas. “No setor específico do livro, dado o hábito dos brasileiros de não incorporarem a leitura como rotina, o indicativo é que esse segmento poderá encolher. Como o valor médio do livro não se assemelha a de um eletro-eletrônico, por exemplo, o setor será menos afetado pelo crédito, mas mais afetado pela cautela do consumidor”. Reinaldo Cafeo, economista do Conselho Regional de Economia, faz uma analise do período em que o Brasil atravessa.


O economista acredita em soluções e confirma que o ano que vem será um ano de desaceleração que atingirá todos os setores, inclusive o mercado editorial. “Mas avalio que será desaceleração e não recessão (crescimento negativo do PIB), portanto, será o momento das promoções, da criatividade, das parcerias entre empresários e funcionários e fundamentalmente estratégia para operar em nível de atividade menor, mas sem perder o horizonte de que mais cedo ou mais tarde a crise passa e quem fez a lição de casa nesse momento, estará mais fortalecido”.
Já o professor Doutor em Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, Fábio Sá Earp, não acredita que a crise mundial afete o mercado editorial no Brasil. “Por esse lado do crédito não irá afetar, pois não existe e nem existirá falta de crédito no Brasil. As editoras praticamente não utilizam crédito em função da alta taxa de juros”.
O que pode ocorrer é uma queda de exportações devido à recessão internacional, com isso diminuindo a renda da população e com isso a compra de livros”.

sábado, 23 de maio de 2009

Discografia


A MÚSICA E O CHARME CARIOCA DE
OLÍVIA BYINGTON

Renata Bianco

...Da janela vê-se o Corcovado e o Redentor que lindo...
Toma-se emprestado do poeta a frase para tentar dar imagem de onde Olívia Byington tira tanta inspiração.
Dona de uma belíssima voz, a cantora e compositora, toca seu violão, compõe suas músicas, tendo como cenário a Lagoa Rodrigo de Freitas, o Corcovado, a orla carioca, ou melhor, a vista inteira do Rio de Janeiro.
Certa vez, ela conta que seu amigo, Juarez Barros, ribeirão pretano, encantou-se com sua voz e a convidou para participar do show, de Emmanuel Donzella que estava no Brasil. O amigo organizou o encontro na casa de Olívia. O ensaio estava todo preparado na varanda da casa, que fica no alto da Gávea.
Assim que o francês pousou no Rio de Janeiro, foi para casa da cantora. “Esse encontro tornou-se histórico, porque assim que ele chegou na minha casa, ele tinha acabado de chegar de Paris. Eu tinha arrumado todo ensaio do lado de fora, com aquela vista maravilhosa. Começamos a tocar e ele começou a chorar. Ficou muito emocionado, às lágrimas, até chegar uma hora que ele parou e disse: Deixe virar-me, eu não estou agüentando olhar esta vista. E aí passou o resto do ensaio de costas”, diverte-se.
Esse encontrou resultou em um convite para cantar nos palcos de Paris. Seu atual show, intitulado de “A Vida é Perto”, mesclado com falas e músicas, que conta a trajetória e histórias de sua vida, fez sucesso na França. Não é para menos. A cantora organizou todo texto além das músicas e adaptou-os para o francês. “Eu realmente me dei o trabalho de fazer tudo em francês e ficou muito bacana. Os textos desse show são muito tocantes. As pessoas riem muito e choram muito. Ele tem os dois lados da emoção, fala da minha vida. O show é um monólogo, uma mistura de artes cênicas com música. Escrevi e dirigi. Ele é todo roteirizado, escrito”, explica a cantora contando que esse espetáculo também já viajou para Portugal e esteve cinco meses em cartaz no Teatro Laura Alvim, no Rio de Janeiro. “Ele entrou pra ficar em cartaz um mês e acabou se estendendo para cinco. Ou seja, teve uma resposta muito bacana. Agora, ele tornou-se um DVD e vai ser lançado em breve pela Biscoito Fino”, orgulha-se.
Otimista, acredita que no Brasil dá-se valor sim à música. “A prova é que sou uma cantora, fora da mídia. Minha música não toca na rádio, e estou fazendo esse show, com essa carreira espetacular. Meu trabalho não é um fenômeno de mídia, então preciso escolher o lugar onde fazer o show, que é para pessoas que vai pelo cult, que me conhece, entende de música, me acompanha, e quando chego sempre aparece alguém com um disco antigo, sabendo as coisas todas”.
Olívia Byington já possui trinta anos de carreira, que começou a decolar, segundo ela, quando tinha 19 anos. “Comecei a carreira cantando rock, meu primeiro conjunto chamava-se “Antena Coletiva” com o maestro e violoncelista Jaques Morelenbaum que hoje em dia trabalha com Caetano. Trabalhei com ele em um tempo que existiam grupos imensos de rock, no final dos anos 70, que era um rock progressivo. Diferente de um rock mais tradicional, esse era um rock com muita orquestra, muito elaborado, que era um caminho para uma música mais sofisticada. Eu costumava cantar Frank Zappa, The Who, Gentle Giant, David Bowie. Uma coisa mesmo daquela época. Eu compunha e nós fazíamos as nossas músicas também. Até eu conhecer esse grupo chamado A Barca do Sol, um dos grupos mais emblemáticos do rock brasileiro”, relembra.
Foi então que estudando violão clássico, conheceu seu ídolo, Egberto Gismonti que acabou participando de seu primeiro disco, “Corra o Risco” em 1978. “Conheci o Egberto e começamos a tocar. Li suas partituras, comecei a cantar com ele, e o resultado foi a sua participação no meu primeiro disco”.
Além de Egberto Gismont, Olívia já se apresentou ao lado de grandes nomes como Chico Buarque, Turíbio Santos, Radamés Gnattali, Paulo Moura e Tom Jobim. “Com Tom Jobim foi há muitos anos quando ele ainda não estava fazendo muitos shows no Brasil. Ele recebeu o prêmio Shell e aí ele me convidou. Isso foi em 1982. Foi à volta do Tom para o Brasil. Ele ainda estava muito tímido de fazer shows. Posso dizer que tive um caminho, não fácil, mas de sorte. Sempre ao lado dos meus grandes ídolos, mas nunca fui por caminho muito comercial. Valorizei muito minha vida pessoal, minha família, meus filhos, e hoje tenho 10 discos”, explica-se.
Falando de influências e gostos musicais, Olívia não esconde sua preferência pela canadense Joni Mitchell, que saiu da soul music para o jazz. “Ela é muito complexa. A vida inteira eu ouvi essa mulher, e vejo que ela vai se transformando, fazendo um trabalho cada vez mais sofisticado, cada vez mais dentro do mundo do jazz”, encanta-se. Quando o assunto é rock, uma das cantoras que a impressionou, e muito, foi Cássia Eller.
“Eu gosto mais do rock quando ele é impactante. Hoje em dia as cantoras estão muito macias, miando muito pro meu gosto. Gosto mais quando as mulheres são mais impositivas, cantam com mais vontade”, enfatiza.
Em meio à secadores e esmaltes, onde a entrevista foi realizada, no charmoso salão do cabeleireiro Ricardo Perez em Ribeirão Preto, a conversa tornou-se descontraída e Olívia contou algumas de suas histórias. Uma delas arrancou gargalhadas de quem estava perto e inevitavelmente a ouviu. “Eu a acendo velas durante o show. Teve um dia que o técnico de som estava acenando lá atrás, e eu pensando. O que é que esse homem tem que ele está acenando feito louco lá de cima?! E logo eu que não gosto de interromper o show por causa de problemas técnicos! Fui disfarçando, sem entender o que estava acontecendo, de repente ele gritou; FOGOOOOO!!! Quando olhei pra trás, as velas tinham derramado do castiçal, tinha uma labareda imensa, quase se transformando num incêndio, aí tive uma presença de espírito. Tenho sempre um copo d’água ao lado do computador que faz parte do meu show. Peguei o copo, me levantei calmamente, e joguei a água, o fogo apagou e continuei”, diz sorrindo.
Mas antes do espetáculo ela confessa que essa calma toda não a acompanha minutos antes de entrar em cena. “Há sempre uma adrenalina antes de entrar no show, senão você não é um artista. Quando estou à beira de um encontro com o público, é feito um encontro amoroso, existe a expectativa, vai acontecer alguma coisa diferente na minha vida ali”, diz com olhar apaixonado de quem vive para música e para seu público.
Para ouvir o som de Olívia Byington clique aqui

Rotas Literárias





A Bahia de Jorge Amado

Renata Bianco

Em meio às plantações amareladas de cacau da Fazenda Auricídia em Ferradas, interior da Bahia, nascia Jorge Amado. Naquele dia, 10 de agosto de 1912, João Amado de Faria e Eulália Leal Amado carregava nos braços aquele que viria a ser um dos maiores romancistas brasileiros. Jorge Amado de Ilhéus, Sergipe, Rio de Janeiro, Manaus, América, Europa. Jorge Amado do mundo. Mas antes de tudo, Jorge Amado da Bahia. É em Salvador, que


"Lívia olha o mar morto de águas de chumbo. Mar sem ondas, pesado, mar de óleo.
Onde estão os navios, os marinheiros e os náufragos?Mar morto de soluços, quedê as mulheres que não vêm chorar os maridos perdidos?Onde estão as crianças que morreram na noite do temporal?Onde está a vela do saveiro que o mar engoliu?E o corpo de Guma que boiava com longos cabelos morenos na água que era azul?Na água plúmbea e pesada do mar morto de óleo corre como uma assombração a luz de uma vela à procura de um afogado.É o mar que morreu, é o mar que está morto, que virou óleo, ficou parado, sem uma onda.Mar morto que não reflete as estrelas nas sua águas pesadas.Se a Lua vier, se a Lua vier com sua luz amarela, correrá por cima do mar morto e procurará como aquela vela o corpo de Guma, o de longos cabelos morenos, o que marchou pela estrada do mar para o caminho das Terras do Sem Fim, das costas da Arocá."
Jorge Amado escreveu Mar Morto, olhando para o mar de Gamboa de Cima, Salvador. Contou a triste história de uma criança criada no cais da Bahia, Guma, que apaixonou-se pela meiga Lívia. Nesta obra, a ação se desenrola principalmente na Cidade Baixa, na estreita faixa de terra entre o mar e a montanha, entre as vielas apertadas do comércio e os grandes espaços abertos do oceano Atlântico, onde vive Inaê, a mãe d'Água, senhora do mar, da vida e da morte de marinheiros e navegantes.
Foi também na Bahia, nas ladeiras do Pelourinho que Dona Flor se entregou aos encantados do malandro Vadinho.
A biografia de Jorge Amado mostra a inquietude que trazia na alma pelas inúmeras viagens que fez. Ainda menino, fugiu do colégio e viajou por dois meses até chegar em Itaporanga, Sergipe, na casa do avô. Essa seria apenas o inicio de uma série de viagens que ele faria. Porém, ter morado no Pelourinho, centro histórico de Salvador, Bahia, marcou definitivamente suas obras.
Mais de oitenta anos se passaram, e o cenário que inspirou Jorge Amado, continua o mesmo, claro que com algumas modificações que a modernização trouxe e refletiu não só na cidade como também nos moradores. O velho malandro, as prostitutas e homossexuais que habitavam as ladeiras hoje trazem um contexto diferente. A Bahia revolucionária de Jorge Amado não existe mais, porém o sincretismo de religiões ainda vive e respira em cada esquina onde ecoam os tambores do candomblé misturados aos gritos de súplicas das igrejas evangélicas e o silêncio dos católicos ajoelhados nas mais de 300 igrejas espalhadas pela cidade.
Este cenário religioso da Bahia serviu para retratar a luta de Antonio Balduíno pela integração do negro na sociedade brasileira. Jubiabá, é o primeiro romance do autor que traz elementos do candomblé, religião afro-brasileira que cultua os orixás, através da figura do pai-de-santo Jubiabá, guia espiritual de Antonio Balduíno. "Cidade religiosa, cidade colonial, cidade negra da Bahia. Igrejas suntuosas bordadas de ouro, casas de azulejos azuis e antigos, sobradões onde a miséria habita, ruas e ladeiras calçadas de pedras, fortes velhos, lugares históricos, e o cais, principalmente o cais, tudo pertence ao negro Antônio Balduíno. Só ele é dono da cidade porque só ele a conhece toda, sabe de todos os seus segredos, vagabundeou em todas as suas ruas, se meteu em quanto barulho, em quanto desastre aconteceu na sua cidade".

Segundo Myriam de Castro Lima Fraga, diretora da Fundação Casa de Jorge Amado, a partir de Jubiabá, terceiro romance da fase urbana, publicado em 1935, começa a adensar-se a relação de Jorge Amado com a cidade do Salvador, “ou cidade da Bahia, como ele preferia chamá-la. Alargando os limites do território onde se movem os personagens, o cenário vai aos poucos se definindo, ganhando contornos, fazendo-se mais e mais presente na narrativa”, analisa.
Para Mirian, é difícil dizer qual obra de Jorge Amado é mais importante principalmente para um autor que escreveu não apenas romances, como também biografias e memórias. “Tratando apenas dos romances relacionados com a cidade do Salvador, vamos encontrar: O país do carnaval, Suor, Jubiabá, Mar Morto, Capitães da Areia, Os Pastores da Noite, Dona Flor e seus Dois Maridos, Tenda dos milagres, Tereza Batista Cansada de Guerra e o Sumiço da Santa”, enumera. “O mais característico na obra de Jorge Amado é sua fidelidade às fontes populares, onde vai buscar inspiração, a partir da observação e do conhecimento, para construir uma saga de grande realismo, embora envolta sempre num manto de fantasia, que faz o encanto e o sabor de suas narrativas”, descreve.
De acordo com Myrian Fraga, o primeiro romance publicado por Jorge Amado, em 1931, O País do Carnaval “põe em relevo o Largo do Pelourinho e seu entorno: o Tabuão, a Baixa dos Sapateiros e o Terreiro de Jesus, cercado de igrejas centenárias. Publicado em 1934, Suor repete o mesmo ambiente, num cenário limitado ao centro da cidade”, diz.
Ela ainda conta que um ano após a publicação de Mar Morto veio a público o livro Capitães da Areia, romance que teve um início de vida atribulado, “com a primeira edição apreendida e exemplares queimados em praça publica de Salvador por autoridades da ditadura do Estado Novo, o que não impediu que logo se tornasse um grande sucesso. Desde então, até hoje, as edições se sucedem atingindo a cifra espantosa de 98 edições e 16 traduções, sendo este o livro de Jorge Amado com maior número de exemplares vendidos”.
Depois desse livro, são publicados, sucessivamente, mais seis romances cuja ação se desenvolve na área urbana de Salvador: A Morte e a morte de Quincas Berro d'Água, que segundo a diretora da Fundação Casa de Jorge Amado na verdade não é considerado um romance, mas uma novela, Os Pastores da noite, Dona Flor e seus dois maridos, Tenda dos Milagres, Tereza Batista Cansada de Guerra e o Sumiço da Santa.
Para Myriam, dessas obras, a mais importante talvez seja Tenda dos Milagres, “embora Dona Flor seja a de maior sucesso, já que foi adaptada para cinema, teatro e televisão. Em Tenda dos Milagres, Jorge Amado retoma os temas anteriormente abordados em Jubiabá, traçando um painel mais aprofundado das relações inter-raciais na sociedade baiana. Talvez tenha sido também o romance preferido de Amado que confessou várias vezes que reconhecia no protagonista, Pedro Arcanjo, seu alter ego”, revela.
Já em Tereza Batista Cansada de Guerra, romance de mais de trezentas páginas, quase inteiramente dedicado à narrativa dos infortúnios da protagonista, a cidade de Salvador só será resgatada, já quase no final do romance quando, depois de percorrer meio mundo, Tereza Batista reencontra o grande amor de sua vida, Januário Gereba, na beira do cais da Baía de Todos os Santos.
O Sumiço da Santa é o último dos romances urbanos escritos por Jorge Amado. “São referidos temas gratos ao autor como: miscigenação, preconceito racial, sincretismo religioso; a memória do povo, suas histórias, suas criações, a tristeza e as alegrias do cotidiano de uma comunidade”, diz Myriam.
Ao perguntar para a diretora da Fundação quem foi o ser humano Jorge Amado, ela o define como uma pessoa que sempre foi generosa, “no mais amplo sentido, fiel às suas crenças e amizades, que não tinha medo de proclamar os seus afetos, mesmo que com isso pudesse contrariar opiniões e julgamentos. Incondicionalmente dedicado à literatura, aos amigos e à família, teve em sua mulher Zélia Gattai, com quem viveu uma intensa e duradoura história de amor, uma companheira constante e uma interlocutora permanente. Poucos escritores brasileiros tiveram uma vida tão plena de realizações, participando ativamente dos acontecimentos mundiais, que redesenharam o mapa da história no século vinte”.




OLHO PARA MATÉRIA – TRECHOS DE OBRAS

"Começou a subir a ladeira de S. Bento vagarosamente. Tomou por São Pedro, atravessou o Largo da Piedade, subiu o Rosário, agora estava nas Mercês". (Capitães da Areia)

"Pedro Bala enquanto sobe a ladeira da Montanha, vai pensando que não existe nada melhor no mundo que andar assim, ao azar, nas ruas da Bahia. Algumas destas ruas são asfaltadas, mas a grande, a imensa maioria é calçada de pedras negras. Moças se debruçam nas janelas dos casarões antigos e ninguém pode saber se é uma costureira que romanticamente espera casar com noivo rico ou se é prostituta que o mira de um balcão velhíssimo, enfeitado apenas de flores. Entram mulheres de negros véus nas igrejas. O sol bate nas pedras ou no asfalto do calçamento, ilumina os telhados das casas. Na sacada de um sobradão, flores medram em pobres latas. São de diversas cores e o sol lhes dá seu diário alimento de luz.” (Capitães de Areia)

"Cidade religiosa, cidade colonial, cidade negra da Bahia. Igrejas suntuosas bordadas de ouro, casas de azulejos azuis e antigos, sobradões onde a miséria habita, ruas e ladeiras calçadas de pedras, fortes velhos, lugares históricos, e o cais, principalmente o cais, tudo pertence ao negro Antônio Balduíno. Só ele é dono da cidade porque só ele a conhece toda, sabe de todos os seus segredos, vagabundeou em todas as suas ruas, se meteu em quanto barulho, em quanto desastre aconteceu na sua cidade". (Jubiabá)